terça-feira, 24 de dezembro de 2024

FATORES QUE CONTRIBUEM PARA CRIAÇÃO DO ESTADO DE CARAJÁS: CENTRALIDADE ECONÔMICA E POLÍTICA DE MARABÁ

 

Para compreendermos melhor a influência não só da centralidade urbana que a cidade média de Marabá exerce hoje, polarizando na dimensão política e econômica na sub-região (sudeste paraense) a qual está inserida, é necessário levarmos em consideração mesmo que de forma rápida que não é só um fato recente, advindo exclusivamente com a implantação dos grandes projetos, vinda de novos agentes político-econômicos e a abertura de rodovias de penetração na região.

Pois, na produção do espaço regional, foi sendo sua centralidade, na verdade, construída ao longo do tempo, a princípio basicamente podendo afirmar que estando relacionada com a valorização de atividades ligadas ao extrativismo vegetal de diferentes produtos econômicos locais.

Uma vez que no começo na condição de povoado Marabá sua configuração geográfica, salvo suas especificidades, não era nada diferente da tendência predominante verificada na realidade de grande parte do restante da região amazônica em que no momento a dinâmica dos rios era fundamental para a realização das atividades econômicas e espaciais (CASTRO,2009).

Surgindo como Burgo do Itacaiúnas, em 1895, menos de duas décadas depois, muda o espaço de localização, passando, então, a ser situada mais exatamente num pontal de terra entre os rios Tocantins e Itacaiúnas, local estratégico para o escoamento da produção, como entreposto comercial do caucho (matéria-prima muito valorizada que produzia uma goma similar à borracha). Com a crise da borracha, durante o século XX, em 1919, houve obviamente abrupta queda da comercialização desse produto, promovendo, por conseguinte, a estagnação econômica regional.

Mas, logo em seguida, imediatamente, se recompõe sua atividade econômica, por sua vez, com a extração da castanha-do-pará passando a ser o produto econômico local a dinamizar demográfica e economicamente a cidade. Já durante a década de 1920, especialmente a partir de 1927, Marabá torna-se o principal produtor de Castanha do Pará no estado do Pará (EMMI, 1999).

O desenvolvimento dessa atividade pela oligarquia regional conhecida também como oligarquia do Tocantins, formada normalmente por importantes comerciantes e políticos donos de terra, foi responsável, concomitantemente, por fortalecer mais a mesma oligarquia regional existente e permitir Marabá ganhar relevância perante o Estado (EMMI, 1999). Sendo que durante mais de 50 anos, o domínio das oligarquias dos castanhais em Marabá foi considerada na época a ordem natural vigente do poder político e da forma de organização política e econômica da região. Ao ponto de Marabá, por exemplo, ainda durante esse contexto, em 1913, de um povoado passar a ser considerado município até, num curto espaço de tempo, em 1923, ser elevada à categoria de cidade. (VELHO,1972).

Portanto, assim, nessa etapa do início da cidade de Marabá podemos historicamente afirmar que é, sem dúvida, com a valorização e o desenvolvimento do extrativismo vegetal das atividades econômicas locais, empreendidas pela oligarquia do Tocantins, baseadas principalmente na exploração, num primeiro momento do caucho, e, num segundo momento, da castanha do Pará que iram ambas, em grande parte, permitir dinamizar econômica, demográfica e politicamente a cidade de Marabá no cenário sub-regional do sudeste paraense ao qual ela está inserida.

Entretanto, a partir de da década de 1960 em diante que observamos propriamente a cidade, de fato, ganhar maior destaque, assumindo novos papéis e formas-conteúdos mais complexas de serem analisadas em virtude do processo de restruturação da produção do espaço regional que nesse momento passa a ocorrer, introduzindo-se novos ritmos e novos rumos, evidenciando intensas transformações e novas configurações territoriais, permitindo, cada vez mais, a cidade de Marabá se consolidar como centro urbano capaz de polarizar e influenciar, especialmente do ponto de vista sub-regional, um número significado de cidades.

Ao passo de ter havido uma importância estratégica conferida a Marabá, dentre outras, como centro urbano no cenário de integração da Amazônia oriental, com intenso e diferenciado processo de urbanização, aonde articulava-a a diversos municípios, na medida em que a nova configuração urbana sustentada na lógica espacial da “rodovia-terra-firme-subsolo” (PORTO-GONÇALVES, 2001) se firmava, ao mesmo tempo, negando a precedente primazia do antigo padrão de organização regional baseado na lógica fluvial dos rios, principalmente com a importância que passa a assumir a Estrada de Ferro Carajás e as rodovias Transamazônica (BR-230), PA-150, BR-222.

Sendo esse momento agora de intensa urbanização com o processo de abertura de rodovias na Amazônia, consequentemente, responsável por enfraquecer a função dos rios como principais vias de circulação na região ao ponto, por exemplo, da capital do Estado do Pará, Belém, perder a condição que antes largamente sustentava de ser a única porta de entrada na região. Resultando logicamente, nesse aspecto geográfico, na maior autonomia assumida pelos outros centros urbanos de sub-regiões como Marabá.

Nesse contexto, Marabá apresenta-se como lócus de grandes investimentos (TAVARES, 1999). Despertando os interesses do capital industrial e financeiro na região (EMMI, 1999). Não mais se restringindo, assim, a influência política e econômica das elites tradicionais da oligarquia regional apoiada no comércio e no extrativismo vegetal (EMMI, 1999), refletindo como resultado do processo de restruturação territorial também no condicionamento de uma nova estrutura de poder, onde passa a haver o predomínio dos novos agentes político-econômicos, tais como grandes pecuaristas, os bancos, as empresas nacionais e até grandes empresas internacionais.

De tal maneira que o surgimento dessa nova elite na região e sua relação com as políticas do governo, consonante a centralidade urbana de Marabá, vão elevar a cidade a condição de “Rurópolis”, sede de substancial importância para apoio ao projeto de urbanismo rural, dotando a cidade de equipamentos urbanos, zona industrial, lotes urbanos e agrícolas (CARDOSO; LIMA, 2009).

Projeto também de grande ou, melhor dizendo, de maior envergadura regional estimulado pelo governo estadual e que tem em Marabá uma das suas principais cidades de apoio foi o PGC (Programa Grande Carajás) que contribuiu, ainda mais, para incrementar o dinamismo da cidade e certamente da região, já que o PGC implicou na criação da ferrovia e do corredor de exportação de Carajás, nas ações empreendidas na exploração mineral da Serra do Carajás, na construção da UHT (Usina Hidrelétrica de Tucuruí) e outras atividades econômicas.

Outro evento que vem se somar dentro desse processo no final da década de 1980, promovida pela Companhia de Desenvolvimento Industrial do Pará (CDI), é a instalação do Distrito Industrial de Marabá (DIM), ligada a produção minério de ferro-gusa através das industriais Companhia Siderúrgica do Pará (COSIPAR) e Siderúrgica de Marabá (SIMARA) (MARABÁ, 2006).

Passando Marabá a ser marcada por forte migração, grandes projetos e destaque político-econômico no estado do Pará. Já que expressa nessa nova estruturação espacial uma concentração em seu ponto de certa disponibilidade de infraestrutura e a uma relativa densidade técnica, de atividades econômicas, sociais e políticas (TRINDADE JR; RIBEIRO, 2008). Já que o conjunto dos projetos e ações sejam governamentais ou empresariais levados adiante, evidenciam resultados que reforçam os impactos que provocaram, sobretudo, do ponto de vista econômico e, simultaneamente, a inegável importância que Marabá progressivamente assume no cenário sub-regional.

Como, por exemplo, o fato de Marabá, no decorrer do tempo, aquecendo a economia sub-regional, passar a conter um total de 873 estabelecimentos, compostos por pequenas, médias e grandes empresas (MARABÁ, 2006); Marabá concentrar investimentos no setor mineral abrigando grande parte dos projetos voltados para cadeia produtiva mineral do sudeste paraense (PARÁ INVESTIMENTOS, 2010); Marabá sendo naturalmente, assim, considerada como importante centro para os negócios e serviços do sul e sudeste do Pará (ONG VIVER CIDADES, 2004).

Porém, não podemos esquecer de destacar sua importância, além da dimensão econômica já mencionada, na dimensão política. Tendo, desde a década de 1960 em diante, o Estado, importante também agente transformador das dinâmicas da sub-região, acompanhado em todos os momentos, paralelamente, seja no projeto de urbanismo rural (cidade de apoio Marabá), nas melhorias infra estruturais (principalmente as aberturas de estradas) ou na exploração mineral (Programa Grande Carajás), atuando com ações governamentais no fornecimento de créditos, incentivos fiscais, dentre outros.

Contudo, a medida em que o Estado se mostra participante, direta e indiretamente, em todas as atividades que foram implementadas como projetos de exploração mineral, urbano rural, infraestruturais, incentivos fiscais e disponibilidades de créditos. Foi ao longo do tempo, de algum modo, contribuindo para possibilitar as condições de se sediar importantes instituições em Marabá.

Podemos visualizarmos do ponto de vista da centralidade política de modo mais evidente possível sua influência pontuando outros elementos também significativos como o fato de Marabá ser sede de importantes instituições governamentais, sejam eles municipais ou principalmente de ordem estaduais e federais que permitem, ainda mais, evidenciar o papel de polarização em abrangência regional dessa mesma cidade, atendendo as necessidades da população pertencente a essa sub-região. Pode ser demonstrado no quadro “1” abaixo.

                                                                                                                                             Quadro 01 – Instituições Públicas Estaduais e Federais localizadas em Marabá




Elaboração: SILVA, Antonio Gustavo, 2017.

Além do quadro 1 acima que reforça a centralidade política regional que Marabá, sem dúvida, exerce no cenário da sub-região através da presença e concentração de importantes instituições, o quadro 2 (NUNES, D. A. 2012) abaixo evidencia a centralidade política indicando a expressiva força e irrefutável papel que Marabá exerce na condição de protagonista do ponto de vista da divisão do Estado do Pará para criação do Estado do Carajás.

Na medida em que demonstra que a maioria dos eventos realizados em função da pró-emancipação do Estado do Carajás quando não foram sediadas em Marabá, mesmo assim, Marabá manteve papel ativo de protagonista, destacando-se no permanente envolvimento, direto e indireto, na criação, participação, organização, mobilização e articulação no projeto com outras cidades da sub-região de influência interessadas no assunto.

Registrando a trajetória dos principais eventos e ações, desde o início com as primeiras reuniões discutindo a necessidade de criação do Estado de Carajás até aos últimos eventos, com a ocorrência do plebiscito sobre a criação do Estado do Carajás.

Quadro 02 - Ações e eventos pró-emancipação do Estado do Carajás.



Elaboração: NUNES, Débora Aquino, 2012.

Outro fator importante que nos permite fornecer uma dimensionalidade do papel de protagonista de Marabá em relação a sua grande parcela de contribuição em prol dos acontecimentos envolvendo a criação do Estado do Carajás é que Marabá não participa somente na mobilização, mas principalmente através dos novos agentes econômicos, pertencentes a elite marabaense, no sentido de proporcionar o financiamento dos eventos. O gráfico 1 abaixo (SILVA, Antonio Gustavo, 2017) baseados em dados (PARÁ, 2012) do tribunal de contas do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) confirmam isso no que diz respeito a localização dos agentes jurídicos contribuintes financeiros para Frente Pró-Carajás.


Gráfico 1. Agentes jurídicos doadores da Frente Pró-Carajás


Elaboração: SILVA, Antonio Gustavo, 2017.

Marabá concentrou mais da metade das pessoas jurídicas que diretamente realizaram doações. Sendo mais precisamente, segundo o gráfico, indicado pela cor azul, na quantidade de cerca de 58,14% de agentes econômicos de pessoas jurídicas contribuindo financeiramente.

Enquanto que, ao mesmo tempo, menos expressivamente, os agentes identificados pela cor laranja e cinza, compostos por outros municípios, pertencentes a outros estados e provenientes de outros municípios do próprio estado do Pará, foram responsáveis no total por pouco menos de 21,00% das doações, numa faixa de 20,93%.

Ainda baseado em dados do TRE (PARÁ, 2012), na Tabela abaixo (NUNES,D. A.2013) no que refere ao valor doado por município para a Frente Pró-criação do Carajás.

Tabela 01 – Valor doado por município para a Frente Pró-criação do Carajás


Elaboração: NUNES, Débora Aquino, 2013.


Conforme a tabela 01 revela 36,74% podemos constatar, mais de um milhão de reais, exatos R$ 1.041.700,00 do valor doado para a campanha pró-Carajás foi originário de agentes concentrados em Marabá, mais que duas vezes maior que o valor doado pelos agentes da segunda cidade, Tucuruí, que mais contribuiu com cerca de 15,89%, correspondendo a R$ 450.500,00 do total das doações. Destacando a importância dos agentes localizados no Sudeste Paraense, principalmente Marabá, que contribuíram ao todo com 78,38%, R$ 2.222.380,60, do total arrecadado.

Sendo assim, percebe-se, então, facilmente que os agentes concentrados em Marabá são não só os que mais se mobilizam e articulam, mas, de fato, os que mais também contribuem para campanha plebiscitária da frente Pró-Carajás.

Conclui-se conforme observado e analisado que a protagonista cidade média de Marabá certamente apresenta significativa centralidade tanto do ponto de vista econômico quanto político, base de importantes projetos, pólo econômico e decisório regional, representações políticas públicas e privadas, centro financeiro e das ações do movimento pró-Carajás (NUNES; LIMA, 2012). O que em conjunto levando em consideração a soma de cada um desses diferentes fatores atestam validamente na direção, ainda mais, de sua importância e reforçam seu inegável papel de protagonista na sub-região a qual faz parte do sudeste paraense.

TEXTO: ANTONIO GUSTAVO

 

REFERÊNCIAS:

ALVES-MAZZOTTI, A.J.; GEWANDSZNAJDER, F. O Método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo: Pioneira, 2004.


CASTRO, Edna. (Org.). Cidades na floresta: São Paulo: Annablume, 2009.


CARDOSO; LIMA. A influência do governo federal sobre cidades na Amazônia: os casos de Marabá e Medicilândia. Novos cadernos NAEA. v.12, n. 1, p. 161-192, jun. Belém, 2009.


EMMI, Marilia. F. A oligarquia do Tocantins e o domínio dos castanhais. 2 ed. Belém: UFPA/NAEA, 1999.


MARABÁ. Prefeitura Municipal. Diagnóstico do Plano Diretor de Marabá. Marabá, 2006.

NUNES, Débora. A; LIMA, M. M. A cidade média de Marabá; novas dinâmicas territoriais e centralidade urbano-regional na Amazônia oriental. In: Anais do I . Seminário de Desenvolvimento Regional, Estado e Sociedade. Rio de Janeiro, 2012.


NUNES, Débora. A. Marabá: Dinâmicas socioespaciais e centralidade política de uma cidade média na Amazônia oriental. Relatório de Pesquisa (Programa de Iniciação Científica – PIBIC/UFPA). Belém, 2012.


ONG VIVER CIDADES. Caracterização sócio econômica de Marabá. Marabá, 2004.


PORTO-GONÇALVES, C. W. Amazônia, amazônias. São Paulo: Contexto, 2001.


PARÁ INVESTIMENTOS. Oportunidades e desafios 2010-2014. 2º ed. Janeiro, 2010.


PARÁ. Tribunal Regional Eleitoral. Prestação de contas nº339.2012.6.140000 (Frente Pró-Carajás). Belém, 2012


SILVA, Antonio Gustavo. Plebiscito do estado do Pará e a relevância sub-regional de Marabá e Santarém: a importância do debate regional na geografia. Marabá: UNIFESSPA, 2018.


TRINDADE JR. Saint-ClairCordeiro. Cidades médias na Amazônia oriental. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, vol. 13, núm. 2, pp.135-151, novembro, 2011.


TAVARES, Maria. G. C. A dinâmica espacial da rede de distribuição de energia elétrica no Estado do Pará (1960 – 1996). Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Instituto de Geociências, UFRJ, 1999.


VELHO, Otávio. G. Frentes de expansão e estrutura agrária: estudo do processo de penetração numa área da Transamazônica. Rio de Janeiro; Zahar, 1972.


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